Texto: Duarte Palha
Design: Joaquim Pedro Quintella
Já o escrevi antes, mas volto a escrevê-lo como introdução a
este texto – isto dos toiros é alimentado pelo pulsar dos sentimentos.
Não podemos fugir deles, nem escondê-los, e este Mentidero é
uma oportunidade privilegiada que tenho de os demonstrar e é isso que farei
sempre que estes me empurrem para a escrita.
Há temporadas que são tudo numa só noite.
Está lá toda a
temporada, todas as dores, todos os treinos, todos os momentos de esforço. Tudo
está lá e tudo se justifica numa só noite. Mais do que isso, num só momento,
pode estar todo um grupo espelhado.
Todos os 18 da trincheira, os da bancada, os retirados, as
mulheres, os amigos. Há momentos, toiros, em que o grupo está lá todo. Todo o
grupo o pega. Todos são cada um dos oito em praça.
Cada um dos oito em praça tem em cima todos os anos e todos
os cabos do grupo. Há noites, que não têm data. São todas as horas de um grupo
resumidas e ficam acima de datas, perdidas no tempo mas guardadas na memória.
Não sei já que dia era. Era Setembro, acho. O dia passou mas
ficou o momento, a história. Isso é que conta, o resto é para livros de atas. A
noite na Nazaré seguia o seu rumo, normal, esperado. Os toiros cumpriam, os
cavaleiros cumpriam, os grupos cumpriam, sem alarido, sem sobressalto,
competentes.
Mas a história não se conta pelos competentes. Conta-se
pelos que rompem a competência e atingem a excelência.
Afonso Henriques recusou ser Conde competente. Queria mais.
Queria ser Rei, estar na história, chegar ao mais alto. E o mesmo fez um grupo
de forcados, nesta noite de data indefinida. Recusou a competência, que isso
não chega. "Queremos mais".
Pela frente, uma guerra da independência, uma cruzada, uma
restauração, tudo junto, em 650
kg. de toiro. Três tentativas, três invasões francesas,
e um grupo, unido em Linhas de Torres, Linhas da Nazaré, Linhas das Caldas,
lutando pela excelência, pelo nível acima - "Dos competentes não reza a
história". Caiu o invasor. Ficou a Pátria que se veste com uma jaqueta nos
ombros.
O toiro foi pegado por um grupo que mostrou tudo o que pode
ser. Foi pegado por um grupo que mostrou tudo o que é. Naqueles minutos, o
grupo não foram oito.
Foram todos. Foram os de dentro, os de fora e os que nunca
foram mas sentem como se fossem. O momento não foi um momento. Foi uma época,
foram mais, Vinte anos.
O "Castro da Nazaré", como por muitos será
lembrado. O último da noite, da última da época, gravou para sempre na memória
como uma temporada, uma história e um grupo se podem resumir a um momento, e
como se defende a Pátria que se sente.
A Pátria que se leva vestida. – O Grupo de Forcados Amadores
das Caldas da Rainha!